sexta-feira, 28 de maio de 2010

7. UMA NOVA PESSOA


"Se alguém está em Cristo, nova criatura é: as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo." II Coríntios 5:17.

Uma pessoa pode não ser capaz de dizer o tempo ou o lugar exactos, ou traçar toda a série de circunstâncias no processo da conversão; mas isto não prova que ela não esteja convertida. Cristo disse a Nicodemos: "O vento sopra onde quer e ouves a sua voz; não sabes de onde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito." João 3:8. Como o vento, que é invisível, mas os seus efeitos são claramente vistos e sentidos, assim é o Espírito de Deus no Seu trabalho no coração humano. Esse poder regenerador, que nenhum olho humano pode ver, gera uma nova vida na alma; cria um novo ser à imagem de Deus. Embora o trabalho do Espírito seja silencioso e imperceptível, os Seus efeitos são manifestos. Se o coração foi renovado pelo Espírito de Deus, a vida dará testemunho desse facto. Embora nada possamos fazer para mudar o nosso coração ou colocar-nos em harmonia com Deus; embora não devamos confiar, de modo nenhum, em nós mesmos ou nas nossas boas obras, a nossa vida revelará se a graça de Deus habita em nós. Será vista uma mudança no carácter, nos hábitos e nas actividades. O contraste será claro e decidido entre o que foi e o que é agora. O carácter é revelado, não por boas ou más acções ocasionais, mas pela tendência habitual das palavras e dos actos.

É verdade que pode haver um comportamento exterior correcto sem o poder renovador de Cristo. O amor da influência e o desejo de ser apreciado pelos outros pode produzir uma vida bem ordenada. O respeito próprio pode levar-nos a evitar a aparência do mal. Um coração egoísta pode realizar acções generosas. Por que meios, então, podemos determinar em que lado estamos?

A quem entregamos o nosso coração? Com quem estão os nossos pensamentos? De quem gostamos de falar? Quem tem as nossas mais calorosas afeições e as nossas melhores energias? Se somos de Cristo, os nossos pensamentos estão n'Ele, e os nossos mais nobres pensamentos serão acerca d'Ele. Tudo o que temos e somos está consagrado a Ele. Almejaremos revelar a Sua imagem, respirar o Seu Espírito, fazer a Sua vontade e agradar-Lhe em todas as coisas.

Aqueles que se tornam novas criaturas em Cristo Jesus produzirão os frutos do Espírito: "amor, alegria, paz, longanimidade, amabilidade, bondade, fé, mansidão, domínio próprio." Gálatas 5:22, 23. Eles não mais se modelam segundo os erros passados, mas pela fé do Filho de Deus seguirão nos Seus passos, reflectirão o Seu carácter e purificar-se-ão como Ele é puro. As coisas que outrora odiavam agora amam, e as coisas que outrora amavam agora odeiam. O orgulhoso e arrogante torna-se manso e humilde de coração. O leviano e o altivo tornam-se sérios e discretos. O bêbado torna-se sóbrio, e o devasso puro. Os costumes e as modas do mundo são postos de lado. Os cristãos buscarão não o "adorno exterior", mas "o homem encoberto no coração, no incorruptível trajo de um espírito manso e quieto." I Pedro 3:3, 4.

Não há evidência de arrependimento genuíno a não ser que se opere uma reforma. Se devolver o penhor, restituir o que tinha roubado, confessar os seus pecados, e amar Deus e os seus semelhantes, o pecador pode estar certo de que passou da morte para a vida.

Quando, como seres errantes e pecadores, vamos a Cristo e nos tornamos participantes da Sua graça perdoadora, brota amor no coração. Cada fardo é leve, pois o que Cristo impõe é fácil. O dever torna-se um deleite, e o sacrifício um prazer. A vereda que antes parecia envolvida em escuridão, torna-se clara com os raios do Sol da Justiça.

A amabilidade do carácter de Cristo será vista nos Seus seguidores. Era Seu deleite fazer a vontade de Deus. Amor a Deus, zelo pela Sua glória, era o poder dominante na vida do nosso Salvador. O amor embelezava e enobrecia todas as Suas acções. O amor é de Deus. O coração não consagrado não o pode originar ou produzir. Ele encontra-se somente no coração onde Jesus reina. "Nós O amamos a Ele, porque Ele nos amou primeiro." I João 4:19. No coração renovado pela graça divina, o amor é o princípio da acção. Ele modifica o carácter, governa os impulsos, controla as paixões, subjuga a inimizade e enobrece as afeições. Este amor, acariciado na alma, adoça a vida e derrama uma influência refinadora sobre todos ao redor.

Há dois erros contra os quais os filhos de Deus - particularmente aqueles que aceitaram recentemente confiar na Sua graça - precisam de se guardar de modo especial. O primeiro, já abordado, é o de olhar para as suas próprias obras, confiando em algo que possam fazer, para se colocarem em harmonia com Deus. Aquele que está a tentar tornar-se santo pelas suas próprias obras ao guardar a lei, está a tentar uma impossibilidade. Tudo o que o homem puder fazer sem Cristo está poluído com egoísmo e pecado. É somente a graça de Cristo, pela fé, que nos pode fazer santos.

O erro oposto e não menos perigoso é o de que a crença em Cristo desobriga os homens de guardar a lei de Deus; de que, uma vez que é somente pela fé que nos tornamos participantes da graça de Cristo, as nossas obras nada têm a ver com a nossa redenção.

Mas notem aqui que a obediência não é uma mera submissão exterior, mas um serviço de amor. A lei de Deus é uma expressão da Sua própria natureza; é uma incorporação do grande princípio de amor, e por conseguinte é o fundamento do Seu governo no Céu e na Terra. Se o nosso coração estiver renovado na semelhança de Deus, se o amor divino estiver implantado na alma, não será a lei de Deus cumprida na vida? Quando o princípio do amor está implantado no coração, quando o homem está renovado segundo a imagem d'Aquele que o criou, a promessa do novo concerto é cumprida: "Porei as Minhas leis nos seus corações, e as escreverei nas suas mentes." Hebreus 10:16. E se a lei estiver escrita no coração, não modelará ela a vida? A obediência - o serviço e a lealdade de amor - é o verdadeiro sinal do discipulado. Assim diz a Escritura: "Este é o amor de Deus; que guardemos os Seus mandamentos." "Aquele que diz: Eu conheço-O, e não guarda os Seus mandamentos é mentiroso, e nele não está a verdade." I João 5:3; 2:4. Em vez de desobrigar o homem da obediência, é a fé, e somente a fé, que nos torna participantes da graça de Cristo, a qual nos capacita a prestar obediência.

Não ganhamos a salvação pela nossa obediência; pois a salvação é a dádiva gratuita de Deus, que deve ser recebida pela fé. Mas a obediência é o fruto da fé. "E bem sabeis que Ele Se manifestou para tirar os nossos pecados; e n'Ele não há pecado. Qualquer que permanece n'Ele não peca; qualquer que peca não O viu nem O conheceu." I João 3:5, 6. Aqui está o verdadeiro teste. Se permanecermos em Cristo, se o amor de Deus habitar em nós, os nossos sentimentos, pensamentos, propósitos e acções estarão em harmonia com a vontade de Deus, tal como está expressa nos preceitos da Sua santa lei. "Filhinhos, ninguém vos engane. Quem pratica a justiça é justo, assim como Ele é justo." I João 3:7. A justiça é definida pelo padrão da santa lei de Deus, tal como foi expressa nos dez preceitos dados no Sinai.

Aquela fé em Cristo que professa desobrigar os homens de obedecer a Deus, não é fé, mas presunção. "Pela graça sois salvos mediante a fé." Efésios 2:8. Mas "a fé, se não tiver as obras, é morta em si mesma." Tiago 2:17. Jesus disse a Seu respeito, antes de vir à Terra: "Deleito-Me em fazer a Tua vontade, ó Deus Meu; sim, a Tua lei está dentro do Meu coração." Salmos 40:8. E imediatamente antes de ascender, de novo, ao Céu, Ele declarou: "Tenho guardado os mandamentos de Meu Pai, e permaneço no Seu amor." João 15:10. A Escritura diz: "E nisto sabemos que O conhecemos: se guardarmos os Seus mandamentos. ... Aquele que diz que está n'Ele, também deve andar como Ele andou." I João 2:3, 6. "Pois, também, Cristo padeceu por nós, deixando-nos o exemplo, para que sigais as Suas pisadas." I Pedro 2:21.

A condição de vida eterna é agora exactamente o que sempre tem sido - exactamente o que era no Paraíso antes da queda dos nossos primeiros pais - perfeita obediência à lei de Deus, perfeita justiça. Se a vida eterna fosse concedida com base em qualquer condição que não esta, então a felicidade de todo o Universo estaria em perigo. Seria aberto o caminho para o pecado ser imortalizado, com todo o seu cortejo de dor e miséria.

Era possível a Adão, antes da queda, formar um carácter justo pela obediência à lei de Deus. Mas ele fracassou nisto e, devido ao seu pecado, a nossa natureza é caída e não podemos tornar-nos a nós mesmos justos. Uma vez que somos pecadores, e não santos, não podemos obedecer perfeitamente à santa lei. Não temos justiça alguma em nós mesmos com a qual satisfazer os requisitos da lei de Deus. Mas Cristo criou um meio de escape para nós. Ele viveu na Terra no meio de provas e tentações, tal como as que temos de enfrentar. Ele viveu uma vida sem pecado. Ele morreu por nós, e agora oferece-Se para tomar os nossos pecados e dar-nos a Sua justiça. Se te deres a Ele, e O aceitares como teu Salvador, então, por mais pecaminosa que possa ter sido a tua vida, por Sua causa, tu és considerado justo. O carácter de Cristo toma o lugar do teu carácter, e tu és aceite perante Deus exactamente como se nunca tivesses pecado.

Mais do que isso, Cristo muda o coração. Ele habita no teu coração pela fé. Tu deves manter esta união com Cristo pela fé e a entrega contínua da tua vontade a Ele; e, enquanto fizeres isto, Ele operará em ti o querer e o efectuar segundo o Seu bom agrado. Deste modo, tu podes dizer: "A vida que agora vivo, na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou, e Se entregou a Si mesmo por mim." Gálatas 2:20. Assim disse Jesus aos Seus discípulos: "Não sois vós quem falará, mas o Espírito do vosso Pai é que fala em vós." Mateus 10:20. Então, com Cristo a trabalhar em vós, manifestarão o mesmo espírito e farão as mesmas obras - obras de justiça e obediência.

Por conseguinte nós nada temos em nós mesmos de que nos vangloriar. Não temos qualquer base para exaltação própria. A nossa única base de esperança está na justiça de Cristo que nos é imputada, e na obra realizada pelo Seu Espírito, em e através de nós.

Quando falamos de fé, há uma distinção que se deve ter em mente. Há uma espécie de crença que é totalmente distinta da fé. A existência e o poder de Deus, a verdade da Sua palavra, são factos que nem mesmo Satanás e as suas hostes podem de coração negar. A Bíblia diz que "os demónios também crêem e estremecem" (Tiago 2:19); mas isto não é fé. Onde há, não somente uma crença na Palavra de Deus, mas uma submissão da vontade a Ele; onde o coração está rendido a Ele, as escolhas fixas n'Ele, há fé - fé que opera por amor e purifica a alma. Mediante esta fé, o coração é renovado à imagem de Deus. E o coração que, no seu estado não renovado, não está sujeito à lei de Deus, nem em verdade o pode estar, agora deleita-se nos Seus santos preceitos, exclamando com o salmista: "Oh! Qunto amo a Tua lei! É a minha meditaçao em todo o dia." Salmos 119:97. E a justiça da lei é cumprida em nós, "que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito." Romanos 8:1.

Há os que têm experimentado o amor perdoador de Cristo e que realmente desejam ser filhos de Deus; contudo, verificam que o seu carácter é imperfeito, a sua vida cheia de defeitos, e chegam a duvidar se o coração já foi renovado pelo Espírito Santo. A esses, gostaria de dizer: não recuem desesperados. Nós precisaremos de, frequentemente, nos prostrarmos e chorarmos aos pés de Jesus, por causa das nossas faltas e erros, mas não devemos ficar desencorajados. Mesmo que sejamos vencidos pelo inimigo, não somos lançados fora, nem abandonados ou rejeitados por Deus. Não! Cristo que está à mão direita de Deus, também faz intercessão por nós. Disse o amado João: "Estas coisas vos escrevo, para que não pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o Justo." I João2:1. E não se esqueçam das palavras de Cristo: "Pois o mesmo Pai vos ama." João 16:27. Ele deseja restaurar-nos n'Ele, para ver a Sua própria pureza e santidade reflectida em nós. E se nos rendermos completamente a Deus, Ele, que começou uma boa obra em nós, a levará avante até ao dia de Jesus Cristo. Orem mais fervorosamente; creiam mais plenamente. À medida que desconfiarmos do nosso próprio poder, confiaremos no poder do nosso Redentor, e louvaremos Aquele que é a "saúde do nosso rosto".

Quanto mais nos aproximarmos de Jesus, mais faltosos nos acharemos aos nossos próprios olhos; pois a nossa vida será mais clara, e as nossas imperfeições serão mais vistas em largo e distinto contraste com a Sua natureza perfeita. Isto é evidência de que os enganos de Satanás perderam o seu poder; de que a influência vivificadora do Espírito de Deus nos está a despertar.

Nenhum amor por Jesus, profundamente enraizado, pode habitar no coração que não reconhece a sua própria pecaminosidade. A pessoa que está transformada pela graça de Cristo admirará o Seu carácter divino; mas, se nós não vemos a nossoa própria deformidade moral, isto é evidência inegável de que não tivemos uma visão da beleza e excelência de Cristo.

Quanto menos coisas virmos dignas de apreço em nós, mais veremos a infinita pureza e amabilidade do nosso Salvador. Uma visão da nossa maldade impele-nos para Aquele que pode perdoar; e quando a pessoa, reconhecendo a sua incapacidade, faz esforços para se aproximar de Cristo, Ele revelar-Se-á em poder. Quanto mais o nosso senso de necessidade nos impelir para Ele e para a Palavra de Deus, mais intensas visões nós teremos do Seu carácter, e mais plenamente reflectiremos a Sua imagem.



«SE  O  CORAÇÃO  FOI  RENOVADO  PELO  ESPÍRITO  DE  DEUS,
A  VIDA  DARÁ  TESTEMUNHO  DESSE  FACTO.»


«NÃO  GANHAMOS  A  SALVAÇÃO  PELA  NOSSA  OBEDIÊNCIA;
POIS  A  SALVAÇÃO  É  A  DÁDIVA  GRATUITA  DE  DEUS,  QUE  DEVE  SER  RECEBIDA  PELA  FÉ.
MAS  A  OBEDIÊNCIA  É  O  FRUTO  DA  FÉ.»


«A  NOSSA  ÚNICA  BASE  DE  ESPERANÇA  ESTÁ  NA  JUSTIÇA  DE  CRISTO  QUE  NOS  É  IMPUTADA,
E  NA  OBRA  REALIZADA  PELO  SEU  ESPÍRITO,  EM  E  ATRAVÉS  DE  NÓS.»